Samarco, Vale e BHP: fundação criada para reparação da tragédia ocorrida na bacia do Rio Doce é alvo de denúncias
08 August 2024 - 2:41AM
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A mineradora Samarco e suas duas acionistas – Vale e BHP
Billiton – foram condenadas pela Justiça Federal por violações
envolvendo uma campanha publicitária sobre as medidas reparatórias
da tragédia ocorrida na bacia do Rio Doce.
A condenação também atinge a Fundação Renova, entidade que foi
criada para gerir todas ações de reparação de danos. Juntas, elas
deverão pagar R$ 56 milhões por danos materiais e morais. Ainda
cabe recurso.
“É evidente o desvio de finalidade da fundação que se prestou a
uma campanha publicitária e de marketing para criação de uma
narrativa fantasiosa a favor da própria fundação. A situação, além
de demonstrar o desrespeito da Renova ao seu próprio estatuto,
demonstra claramente uma falta de respeito em relação às vítimas e
à sociedade brasileira”, registra a decisão assinada pelo juiz
Vinícius Cobucci.
A tragédia ocorreu em novembro de 2015. O rompimento de uma
barragem da Samarco no município de Mariana, em Minas Gerais,
liberou uma avalanche de rejeitos, causando 19 mortes e gerando
impactos para populações de dezenas de cidades mineiras e capixabas
ao longo da bacia do Rio Doce.
Poucos meses depois do episódio, as mineradoras, a União e os
governos de Minas Gerais e do Espírito Santo firmaram um acordo de
reparação que ficou conhecido com Termo de Transação e Ajustamento
de Conduta (TTAC). Com base nele, foi criada a Fundação Renova. Ela
assumiu a gestão de mais de 40 programas, cabendo às mineradoras o
custeio de todas as medidas.
Porém, passados mais de 8 anos, a atuação da entidade é alvo de
diversos questionamentos judiciais por parte dos atingidos, do
Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e do Ministério Público
Federal (MPF). Há discussões envolvendo desde a demora para a
conclusão das obras de reconstrução dos distritos arrasados na
tragédia até os valores indenizatórios.
A falta de autonomia da Fundação Renova perante as mineradoras é
outra questão contestada pelo MPMG, pelo MPF, pela Defensoria
Pública da União (DPU) e pelas Defensorias Públicas de Minas Gerais
e do Espírito Santo. Juntas, foram também as quatro instituições de
Justiça que apresentaram, em uma ação civil pública movida no ano
de 2021, a denúncia de que havia “propaganda enganosa” no material
publicitário distribuído pela entidade.
Elas reuniram conteúdos que teriam “informações imprecisas,
dúbias, incompletas ou equivocadas” e que estariam “noticiando o
restabelecimento de uma normalidade inexistente, em temas
fundamentais para a população, como a qualidade da água e do
ambiente aquático, recuperação de nascentes e bioengenharia,
recuperação econômica, indenização, reassentamento e concentração
de rejeitos”.
A ação também mencionou a existência de estudos científicos,
perícias e trabalhos de campo realizados por especialistas que
demonstrariam o contrário do que apregoam os materiais publicizados
pela Fundação Renova.
“No período de pouco mais de um mês [6 de setembro a 11 de
outubro de 2020], a Fundação despendeu R$ 17,4 milhões com um único
contrato de publicidade, cujo objetivo foi tão somente o de
promover uma imagem positiva da entidade e de suas mantenedoras. Ao
todo, foram 861 inserções em TVs e 756 em emissoras de rádio, sem
incluir o material divulgado em veículos impressos e portais de
notícias”, afirmaram, na época, as instituições de Justiça. Elas
avaliaram que as inserções publicitárias não têm os atingidos como
verdadeiro público-alvo, mas investidores e a sociedade em
geral.
“Tais valores adquirem especial relevância quando se constata
que eles foram gastos em detrimento de diversos programas cuja
execução é a única razão da existência da Renova. Prova disso é que
os R$ 17,4 milhões gastos com a campanha veiculada em 2020 são
superiores ao valor individualmente gasto em 13 dos 42 programas
previstos no acordo que criou a entidade, conforme dados
apresentados no site da própria fundação”, acrescentaram.
Condenação
Embora divulgada na terça-feira (6) pelo MPF, a decisão foi
assinada há 2 semanas. Conforme a condenação, além de pagar R$ 56
milhões por danos materiais e morais, as mineradoras e a Fundação
Renova deverão realizar uma contrapropaganda, com novas peças
trazendo esclarecimentos sobre tópicos presentes nas publicidades
que foram considerados incorretos, inverídicos ou imprecisos.
A decisão observa que uma das obrigações da Fundação Renova
previstas no TTAC é a veiculação de informações de forma
transparente, clara e objetiva. Segundo o juiz Vinícius Cobucci, as
peças veiculadas pela entidade tentam romantizar a reparação, são
destinadas à autopromoção, relativizam o sofrimento dos
atingidos.
Ele considerou que houve “verdadeira campanha de desinformação,
com o intuito de minimizar o impacto do rompimento da barragem” e
avaliou que a “tentativa de controle da narrativa para criar uma
campanha orquestrada de desinformação não é apenas imoral, como
ilegal”. Cobucci também lamentou a postura da Fundação Renova de
sempre responsabilizar terceiros por atrasos e outros problemas.
“Não há autocrítica ou humildade para admitir que a fundação
erra.”
A Fundação Renova afirmou que atua nos limites do TTAC e que
apresentará recurso contra a referida decisão. A Samarco informou
que se manifestará sobre o assunto apenas nos autos do processo. A
Vale (BOV:VALE3) e a BHP Billiton não se posicionaram.
O descontentamento com o processo reparatório levou os governos,
as mineradoras e as instituições de Justiça a iniciarem em 2022 uma
negociação para um acordo de repactuação, capaz de apontar solução
para mais de 85 mil processos atualmente em tramitação. Até o
momento, no entanto, não houve sucesso devido à falta de consenso
em torno dos valores. A oferta das mineradoras têm sido considerada
insuficiente pelas demais partes.
Informações Infomoney
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